A diferença nunca foi tão valorizada. Em tempos de radicalismo religioso, intolerância cultural, opressão às minorias, conservadorismo sexual e outros tipos de reações agressivas e preconceituosas à diversidade, o mundo empresarial está, aos poucos, descobrindo que incluir e promover o desenvolvimento de profissionais das mais variadas etnias, credos e sexo não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas pode agregar valor ao negócio.
Há hoje um consenso no mundo empresarial de que a homogeneidade é menos criativa, inovadora e mais restritiva, já que tende a encarar o mundo sob a mesma ótica. "Toda unanimidade é burra", já profetizou o dramaturgo Nelson Rodrigues. Para fugir desta ignorância, as empresas buscam, por meio de programas estruturados, incluir a diversidade em seu quadro de colaboradores. Mas essa não é uma tarefa fácil, sobretudo porque envolve questões arraigadas em valores e tradições da sociedade.
"É um processo que requer investimento em educação, não basta apenas um treinamento de integração", alerta Gilson Trindade, diretor da consultoria TWG-Brasil. Por envolver uma mudança cultural, a diversidade interna é um assunto bastante discutido, mas raramente praticado na sua totalidade pelas empresas. As pessoas não estão acostumadas a conviver com deficientes, enxergar o negro sem o prisma do preconceito, ver a mulher como profissional e não como esposa e outros mitos que permeiam o inconsciente coletivo.
Outro problema comum é vincular programas de responsabilidade social aos de inclusão. "As pessoas não sabem distinguir o que são programas de diversidade e o que é projeto para 'coitadinho'", censura Açucena Calixto Bonanato, diretora da Suporte Assessoria e Consultoria de RH, empresa especializada na seleção e desenvolvimento de pessoas com necessidades especiais. Segundo ela, esta questão precisa estar bem clara para que um programa com este foco possa ter sucesso.
Um projeto social é a contribuição que uma empresa dá a uma comunidade carente por meio de diversas ações que visem promover a melhora das condições de vida. Promoção da diversidade interna não tem absolutamente nada a ver com isso. É um processo altamente profissional cujo foco é o recrutamento de profissionais "diferentes", dando a eles igualdade de direitos e eliminando as barreiras para seu desenvolvimento na organização. Mesmo que a empresa esteja disposta a promover tanto as mudanças físicas quanto culturais para trazer a diversidade para sua estrutura, ela ainda vai enfrentar outro obstáculo: encontrar pessoas capacitadas.
Como o nível de exigência é bastante elevado, as empresas precisam rever os requisitos de admissão para encontrar estes profissionais. Para solucionar a questão, a Du Pont, uma das primeiras empresas a terem esta preocupação, adotou a estratégia de promover a capacitação de jovens negros. Com o apoio de um instituto de Barueri, ela custeou a faculdade e curso de idiomas de dez jovens, que ainda fazem estágio na organização. Assim que o programa acabar, parte dos jovens será integrada ao quadro. Com tantas dificuldades, será que realmente vale a pena investir nesse tipo de programa? "Sem dúvida", garante Regina Burti, gerente de RH da Du Pont. "A diversidade traz vários benefícios à organização tanto para o clima interno, já que as pessoas se motivam e gostam de trabalhar numa empresa que tem esta preocupação, quanto para o desempenho do time".
Mas o grande impacto da diversidade está mesmo na relação com o público externo. "Nossos clientes da América Latina se sentem mais à vontade quando ligam para nossa Central de Atendimento e conversam com pessoas que além de falarem o mesmo idioma, também compartilham da mesma cultura", ressalta Soraia Franco, presidente do Conselho de Diversidade da Cummins Latin America. Isto só é possível porque fazem parte do foco de atuação da empresa os grupos: negros, mulheres, deficientes, estrangeiros e asiáticos.
Elas praticam a diversidade.
Há no Brasil bons exemplos de programas de inclusão, que seguem as orientações das matrizes, já que fazem parte, muitas vezes, dos valores da companhia. Na Cummins, fabricante de motores diesel, a estratégia foi a criação de um Conselho da Diversidade, que reúne profissionais das mais diversas áreas, para discutir problemas ligados à inclusão. Por meio dele, já foram tomadas ações para tornar o ambiente propício aos mais diferentes tipos de profissionais: estudos ergonômicos, creches, treinamento sobre o tema, programas de condicionamento físico e comemoração das datas especiais. "O objetivo é criar na empresa um ambiente de inclusão para receber bem nossos clientes, ou seja, para que eles se sintam em casa, com pessoas de casa", explica Soraia Franco, presidente do Conselho de Diversidade.
Os treinamentos são as principais ferramentas para a integração da diversidade. Um deles é chamado "Espectro da Diversidade", no qual os funcionários podem vivenciar várias situações que envolvem as diferenças, abordando-as de maneira positiva. Todos os funcionários já passaram por este treinamento e trimestralmente há novas turmas para os colaboradores recém-contratados.
Outro treinamento, a "2ª Geração da Diversidade", é focado nas lideranças e discute casos mais polêmicos. "Se os líderes não estiverem seguros com o conceito, não há o efeito cascata", aponta Soraia. Além destes esforços, a empresa também disponibiliza os canais de comunicação para o acompanhamento de possíveis casos de rejeição. Com isso, 36% do quadro de funcionários são formados pela diversidade.
A criação de um grupo focado no tema também foi a solução encontrada pela Du Pont para promover a inclusão. Só que neste caso, foram criados diversos grupos. O das mulheres é o mais estruturado. Lá, se discutem questões relacionadas ao "teto de vidro" que impede o crescimento das mulheres na organização. Embora a mulher tenha conquistado bastante espaço no mundo corporativo (o que a tiraria do rol das minorias), ainda existem muitos obstáculos a serem transpostos até fazerem parte de todos os níveis hierárquicos. (A edição nº 73, março/2004, do Profissional & Negócios trouxe esta discussão).
Além do grupo de afro-descendentes, na Du Pont também existe um grupo formado por homossexuais. "É um grupo pequeno, porque sabemos que muitas pessoas têm medo de se revelar, por isso temos líderes heterossexuais que participam do grupo para apoiar e estimular a iniciativa", conta Regina Burti, gerente de RH.
A questão sexual é ainda coberta de misticismo num ambiente organizacional. Uma empresa que tem conseguido tratar isso de forma clara é a IBM. Parceiros de funcionários homossexuais têm acesso aos benefícios, como plano de saúde médico e odontológico, o que já acontece com casais de sexo diferente. Além disso, a IBM também concede benefícios aos parceiros de funcionários com menos de cinco anos de união sem casamento, independente da igualdade ou não de sexo.
Esta política faz parte do programa "Domestic Partners". Inovadora, especialmente no mercado brasileiro de tecnologia da informação, a extensão de benefícios a uniões de mesmo sexo é uma diferenciação do padrão das relações de trabalho no país.
Segundo Paulo Portela, diretor de Recursos Humanos da IBM Brasil, a novidade é mais uma ação prática da política de diversidade da empresa. "Além das várias iniciativas para assegurar o respeito à diferença, também tomamos medidas que garantam mudanças imediatas no dia-a-dia das pessoas", diz ele.